sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Dois poemas de José Gomes Ferreira



Quero voar
– mas saem da lama
garras de chão
que me prendem os tornozelos.

Quero morrer
-mas descem das nuvens
braços de angústia
que me seguram pelos cabelos.

E assim suspenso
no clamor da tempestade
como um saco de problemas
– tapo os olhos com as lágrimas
para não ver as algemas...

(Mas qualquer balouçar ao vento me parece Liberdade.)


*

Porque é que este sonho absurdo
a que chamam realidade
não me obedece como os outros
que trago na cabeça?

Eis a grande raiva!
Misturem-na com rosas
e chamem-lhe vida.




José Gomes Ferreira nasceu em 9 de junho de 1900, no Porto. Escritor, poeta e ficcionista, formou-se em Direito em 1924, tendo sido cônsul na Noruega entre 1925 e 1929. Após o seu regresso a Portugal, enveredou pela carreira jornalística. Foi colaborador de vários jornais e revistas, tais como a Presença, a Seara Nova e Gazeta Musical e Todas as Artes. Esteve ligado ao grupo do Novo Cancioneiro, sendo geral o reconhecimento das afinidades entre a sua obra e o neo-realismo. Autor de obra vasta, de sua poesia se destacam títulos com Lírios do monte, o primeiro do gênero, apresentado precocemente em 1918, Longe (1921) e Poeta militante 1, 2 e 3 (1978). Morreu no dia 8 de fevereiro de 1985.