quinta-feira, 22 de maio de 2014

Três poemas de Olga Savary



ÁGUA ÁGUA

Menina sublunar, afogada,
que voz de prata te embala
toda desfolhada?

Tendo como um só adorno
o anel de seus vestidos,
ela própria é quem se encanta
numa canção de acalanto
presa ainda na garganta.


AMOR

O que será:
este labirinto de perguntas
e resposta alguma,
este insistente rugir
de pássaros, este abrir
as jaulas, soltar o bicho
novelo que há em nós,
delicado/feroz morder
(deixa sangrar)
o outro bicho (deixa, deixa)
e toda esta parafernália
a parecer truque enquanto
obsidiante você mente
embora acreditando nas mentiras
e eu use os piores estratagemas
para cobrir-me a retirada
desse vicioso campo de batalha.


UM DIA, OSSOS

A manhã trouxe surpresa de ossos
Guardados em gavetas
Ou organizados atrás de opalescentes,
Dourados vidros,
No corredor propício ao mistério.
Então é o susto nos olhos
E o medo nas mãos inábeis
Tocando toda essa precária matéria
Antiga e clara
E tirando no toque o som de uma música
Escondida
Nessa antiquíssima,
Milenar memória.



Olga Savary nasceu em Belém a 21 de maio de 1933. Além desta cidade, viveu em Fortaleza e no Rio de Janeiro, onde residia. Escreveu prosa e poesia. Entre os livros publicados neste último gênero estão Espelho provisório, o de estreia na poesia em 1970, Sumidouro (1977), Magma (1982), Berço esplendido (1987), Rudá (1994), entre outros. Olga Savary morreu no dia 16 de maio de 2020.

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